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O CHÃO DA TERRA

Wair de Paula, Jr.

O poeta Pablo Neruda vaticinou que “...sobre a terra, antes da escrita e da imprensa, existia a poesia.” E eu quis fazer uma interpretação literal desta frase, para exaltar as qualidades da terra, deste elemento básico, ancestral, e que, num dado momento, nós que moramos na cidade grande, esquecemos de valorizar. Talvez eu ainda esteja impressionado com a leitura do livro Torto Arado, o magnífico romance escrito por Itamar Vieira Junior, que descreve a passagem dos personagens sobre o chão que habitam de forma magistral, mas também tenho que assumir que sempre achei fascinante o processo de transformar o barro em paredes, esculturas, objetos e utilitários. Quem não se lembra da cena do filme com uma jovem Demi Moore moldando o barro em suas mãos (e este filme já tem mais de 30 anos...)? Mesmo quem não era vivo à época, já deve ter visto uma menção a esta cena. Modelar o barro com as mãos dá um sentido de criar algo físico através de elementos tão naturais, que aproxima o homem da divindade. Talvez eu esteja sendo poético demais, mas eu adoro todas as etapas que compõem este processo. E para abrir este post, a foto dos vasos acima, da Ekko Home, não poderia ser mais adequada. As formas orgânicas, suaves, um certo sentido de imperfeição que acho maravilhoso, considero tudo isto fascinante.

A primeira panela deve ter sido feita de barro, o que possibilitou ao homem infinitas possibilidades de alimentação, não apenas a caça sobre uma fogueira. E eu me pego pensando “quem será que pensou em juntar legumes e carnes num recipiente cerâmico para fazer um cozido daqueles?”. A evolução do homem não se dá – ou se registra – apenas através das grandes invenções, as pequenas descobertas do cotidiano são igualmente – ou mais, às vezes – importantes. Termos isso em mente é extremamente importante para percebermos a beleza da vida e de aspectos do dia a dia. Como quando eu parei para observar os vasos acima, ainda da Ekko Home, em infinitos tons de branco, formas variadas, puras, impecáveis.

Falando em formas, eu fiquei apaixonado pelo revestimento acima, da Mais Revestimentos. Esse rigor geométrico manifestado através desta matéria prima é maravilhoso, uma preciosidade mesmo. E através desta foto lembrei-me de um de meus primeiros apartamentos, quando ainda jovem (e com orçamento apertado) pintei as paredes de toda a área de estar de um tom de terracota profundo, e os móveis eram praticamente todos em tons de cru e preto. Desta forma, eu consegui dar um sentido de drama cenográfico bastante elegante, e quem chegava em casa se impressionava com aquela ambientação, que fora feita, à época, com materiais e produtos bastante simples.

A observação dos frutos da terra pode gerar produtos altamente poéticos, como é o caso destas jacas expostas na vitrine da Dracena Home, cenário de Mario Santos, grande conhecedor de produtos com esta origem. Mario é filho de Janete Costa, uma grande designer de interiores que foi precursora na divulgação da arte popular (ou não erudita, como gosta de dizer uma amiga em comum) na decoração brasileira. Eu sou um grande entusiasta deste tipo de manifestação artística, considero estas manufaturas não apenas extremamente originais e proprietárias de um caráter muito lúdico, mas também muito elegantes, altamente decorativas.

E eu estava a caminho de meu escritório, no Casashopping, quando fui subitamente atraído pelas peças acima, expostas numa mesa no centro da loja Studio Grabowsky. Não somente as formas eram clássicas, como acrescidas desta pintura quase naif que conferiu a elas um aspecto moderno, algo entre as manifestações ancestrais e um quê de Paris anos 1940, lindos de viver como diria a famosa apresentadora de TV. Puro luxo.

Visualmente oposto à imagem anterior, estes vasos da Tutto Per la Casa são igualmente fascinantes. Suas formas parecem ter sido desenhadas a lápis, um rigor geométrico fortíssimo contrastando com a textura irregular, em belo diálogo. Eu juro que tento, mas não consigo ter uma alma esteticamente clean, eu gosto desta mistura de informações, técnicas, origens, conceitos. Acredito piamente na mistura de culturas para compor a decoração de minha casa, onde o erudito e o popular se encontram, onde uma peça de manufatura rústica ou ancestral se encontra com algo tecnológico, em sou um homem de meu tempo, mas com fundamentos no passado (muito lá atrás, não apenas no meu passado) e um olhar para o futuro.

E este conjunto de mesas da Ovoo parece conjugar esse discurso pessoal em uma única peça – a ancestralidade da base (tanto na forma quanto na matéria prima) em contraste com o tampo. Como criador, gosto de observar estes produtos, e analisar as influências que o criaram. Toda e qualquer influência sempre é bem-vinda, se interpretada com ética e qualidade. Somos a soma de nossas informações, e os produtos que compõem a nossa casa devem seguir este mesmo traçado.

Mesmo assumindo aspectos esteticamente muito rigorosos e contemporâneos – como é o caso do revestimento acima, este ladrilho maravilhoso da Empporium Frei Caneca – as matérias primas naturais têm uma história de longa data com nossas casas. Valorizar estes aspectos não apenas confere personalidade ao ambiente, como também traduzem o espírito dos donos da casa, sejam estes jovens ou com mais trajetória (para evitar o uso da palavra idade...rs).

Existe um ditado hindu que diz algo como “...o mesmo solo que te faz cair é o que te ajuda a levantar.” É uma metáfora interessante sobre nossa participação neste mundo, de como percorreremos nossos caminhos. Se o pudermos fazer sempre de modo ético, mas cercado por objetos de beleza incontestável como os deste post, este caminho se tornará indiscutivelmente mais agradável.

 

Wair de Paula Jr.

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