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A Cor de 2024

Wair de Paula, Jr.

Há algum tempo a Pantone tem se dedicado a traduzir as tendências socio/culturais e transformá-la em uma cor, que, teoricamente, vai reger alguns aspectos de nossa vida – o design, a moda, o design de interiores, etc. E, para 2024, indicaram a Peach Fuzz (ou penugem de pêssego, em tradução literal - cor 13-1023 do catálogo homônimo) como a cor de 2024, justificando esta como a escolha por ser “...uma cor radiante com elegância moderna. Uma sombra que ressoa com compaixão, oferece um abraço tátil e une facilmente o jovem ao atemporal.”

Apesar da tendência, eu confesso que as com cores “frágeis” não estão no meu ponto de interesse estético, gosto mais da ousadia das cores intensas, ou sozinhas ou combinadas, e quem é surfa nessa onda com muita propriedade é meu amigo Chicô Gouvêa, que em sua residência carioca fez uma mistura de cores fortes de muita propriedade, aquela mistura que eu adoro de épocas, estilos, origens, referências, o que torna o trabalho dele sempre muito especial aos meus olhos. E Chicô tem aquela característica de colecionador que é um elemento que valorizo muito, suas estantes são repletas de livros, objetos, obras de arte, gadgets, seu acervo é plural, cujo dogma principal é o gosto do dono da casa, o que considero imprescindível -  coisa que infelizmente estamos cada vez menos vendo nas redes sociais (visto que as revistas do segmento praticamente acabaram), um universo bege, cinza claro e cru.

Aqui, uma foto da Ilha de Burano (de autoria do fotógrafo italiano Giovanni Genzini), com suas casas em inúmeras cores, ilustra bem meu ponto de vista - cada um faz o que quer e o que gosta neste segmento, o livre arbítrio (ético, sempre) deveria ser o único dogma vigente para o universo do design de interiores. Passear pelos corredores do nosso Shopping é a comprovação deste, nosso paisagismo têm cores, nossas lojas têm cores, até nossos gatos têm cores... Outro dia um conhecido falou que as pessoas preferem espaços neutros pois assim eles não se cansam destes. Eu, particularmente, considero entediante ver tanta casa em semitons, parecem destituídas de história, de vivência. As pessoas mais interessantes que conheci e/ou conheço fazem uso da cor em suas casas, seja nas paredes, nos moveis, tapetes, o que seja. São pessoas que preferem o Toddy ao tédio, como disse certa escritora.

Uma prova – a cozinha proposta por Amanda Miranda para a Casa Cor Rio 2024 – pode ser mais charmosa? Dá vontade de ficar o dia cozinhando, conversando, bebendo e comendo neste espaço, uma verdadeira ode aos sentidos, com seus armários em ocre contrastando com as paredes estampadas em verde, uma brasilidade na veia de alta octanagem, coisa difícil de fazer, mas de resultado absolutamente m-a-r-a-v-i-l-h-o-s-o! Os armários deste espaço são da Todeschini e os eletrodomésticos da Elettromec, e ambas as empresas devem estar orgulhosas e felizes em verem seus produtos expostos com tamanha qualidade.

Outra prova – o speak easy bar que Tiago Freire fez para a mesma Casa Cor Rio 2024. Uma bancada em cerâmica verde azulada e paredes em um tom de terracota suave (da Coral, por Taeco Tintas) e um bar absurdo de bem montado, cores intensas colocadas de novo com maestria, ousadia e muita competência, resultando em um espaço acolhedor, dinâmico, elegante e absolutamente atemporal – nada aí remetia a uma época específica, apesar do tema lembrar os bares da época da lei seca norteamericana. E o tapete lindo da Galeria Hathi amarrando todas estas texturas e cores, um espaço para não se esquecer.

A dupla Bitty Talbot e Cecilia Teixeira, da Brise Arquitetura, também fez bonito com esse balcão em cerâmica verde e parede quase no mesmo tom (também da Coral por Taeco Tintas), trazendo uma elegância bem gostosa para o restaurante de Adriana Mattar na Casa Cor Rio 2024.A foto de André Nazareth mostra a preocupação com os detalhes, o piso em padrão Chevron, iluminação precisa e obras de arte bem colocadas, uma aula de como se projetar um restaurante com características bem brasileiras e, por isso mesmo, internacionais. Não se pode ser internacional sem conhecer profundamente suas raízes, já me ensinou a mestra Janete Costa – e eu acredito piamente nesta frase.

Mesmo os tons mais suaves têm seu local neste meu ponto de vista – eu não gosto é da covardia tonal, por assim dizer. Gisele Taranto deu um show na sua suíte para a mesma versão da Casa Cor, com as paredes pintadas em uma textura suave em tons de azul em contraste com as boiseries e molduras em branco, perfeitamente casadas com os vitrais existentes no Palacete Brando Barbosa, onde aconteceu este evento. E a cama da Arquivo Contemporâneo, em frente às janelas adornadas pelas cortinas da Uniflex, era um convite ao descanso, ao bem-estar, ao tão necessário dolce far niente, outra aula de competência desta profissional.

Estreante na Casa Cor, Tom Castro literalmente arrasou com suas paredes e teto negros, onde posicionou obras de cores fortes de modo extremamente gráfico, moderno, uma Galeria impecável onde os poucos móveis e acessórios, todos da Arquivo Contemporâneo, provocavam o usuário a usufruir este espaço em um outro tempo, uma outra dimensão. E eu confesso que sou alucinado pelo trabalho de Leo Romano, o autor do espelho da foto acima – este é um criador extremamente original, poético, uma prova de que o Brasil é um país plural e vasto em criatividade (ele é de Goiânia).

Meu conhecido de longa data Erick Figueira de Mello também arrasou neste ambiente em vermelho com móveis em cru e preto, puro drama, conduzido com mão de mestre por este profissional. E o contraste deste ambiente vermelho com o exterior totalmente invadido pela natureza era maravilhoso. E o ambiente tinha um certo aspecto fin du siècle com seus móveis em fibra vegetal em preto – da Galeria Hathi, assim como os tapetes – e as luminárias pequenas ladeando as janelas. Puro luxo...

Para não me acusarem de preconceituoso, eu precisava mostrar este espaço branco deslumbrante, o Bar do Jardim feito por Diego Raposo e Manu Simas. Aqui, as cortinas brancas (da Guilha), as arandelas da Lumini e os revestimentos da Ekko receberam a natureza com muita propriedade, e este pé direito alto não atrapalhou a percepção do espaço, absolutamente aconchegante, gostoso, lúdico e prático. Este é um espaço carioca por excelência, cercado pelo verde e em frente à uma fonte linda, generosa.

E minha sócia Lenora Lohrisch e eu também não brincamos em serviço no quesito cor -para a Casa Cor pintamos as paredes em vermelho – uma cor deslumbrante da Coral, que fizemos na Taeco Tintas – e que criavam um diálogo com a marcenaria original da casa, em rosa/azul/cru, em franco, assumido e belo contraste. Em uma das portas, inserimos este imenso nicho, marcenaria deslumbrantemente feita pela Roma Mobili, para receber uma escultura do mestre Ceschiatti bastante apolínea. E o espelho ainda refletia a escultura de Franz Kracjberg, da Galeria A.Thebaldi, uma mais belas obras deste escultor que eu já vi na vida, em perfeita conjunção com o espaço.

 

Acho que eu me fiz explicar neste post – minha predileção pelas cores que me cercam, que nos cercam, e que podem adentrar pela casa sem cansar, ao contrário – valoriza os aspectos construtivos do projeto, as obras de arte, e os ambientes ficam personalizados, únicos. Vamos às cores, por favor...

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