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Tempo, Tempo

Wair de Paula, Jr.

“...És um senhor tão bonito, quanto a cara de seu filho, tempo tempo tempo tempo...”
Caetano discorre sobre o tempo e a passagem deste de sua forma habitual – poética, milimetricamente pensada, sempre instigando nosso pensamento e, no caso, memórias. O tempo passado é sempre uma fonte de referência para criativos, e eu lembrei de um fato ao ver a poltrona acima, do acervo da Way Design (no espaço de Henrique Ramalho Arquitetura nesta loja) – quando criança, ao passar férias na casa de minha avó paterna, ficava horas em uma poltrona grande que ela tinha, com a cabeça em um dos braços e as pernas em outro, lendo livros e revistas de toda sorte – e isso fez com que eu, décadas depois, fizesse para uma marca de móveis uma poltrona com aquelas características, porém adequadas ao meu tamanho (e peso) adulto. A poltrona (e puff) Cacau acima parece ter sido feita para este uso, com um braço mais alto do que o outro, larga, perfeita para rever estes momentos da infância, mas com o conforto contemporâneo.

Prego que o passado é um lugar de referência, mas não de residência – sou um homem de meu tempo, porém amalgamado por uma série de referências e momentos que o tempo me proporcionou. E pensei nesta mistura de tempos ao ver esta poltrona, na vitrine da Way Design, estruturada em um tubo de aço inox e revestida com uma deliciosa pele (sintética, como manda o figurino contemporâneo), uma mistura de passado com moderno em perfeita dialética. Não resisti, tive que entrar na vitrine para experimentar esta poltrona, e adorei...Ainda mais porque ela está frente a este relevo de parede de autoria de Armarinhos Teixeira, da Galeria A. Thebaldi, e eu curto muito este trabalho, tem um quociente de ancestralidade subjugado a um aspecto contemporâneo que muito me agrada.

Já que o tema é Tempo...a foto acima, retirada do perfil da Hio Decor, traduz de forma maravilhosamente poética a fruição do tempo para aqueles que se prestam a isso – esta poltrona (que é flutuante, diga-se de passagem!) que oferece conforto e uma vista para o infinito, é inspiradora! Eu sempre que posso me ofereço estes momentos de fruição para com a natureza, me conectar com estes valores perenes me faz desestressar da correria diária.

O vaso da Organne, na foto acima, parece ter sido retirado de alguma escavação arqueológica, com marcas do tempo sobre sua superfície. Muito embora seja uma peça feita recentemente, esta característica impregnada sobre seu desenho é fascinante, realmente parece uma peça antiga, que esteve sob a ação do tempo durante décadas, talvez séculos. Esta marca tem um acervo bastante grande de vasos com esta característica, um mais bonito que o outro, eu já fiz uso destes em meu espaço na Casa  Cor Rio ano passado, misturado à arte moderna e design contemporâneo, gosto desta mistura...

A estante acima, da Way Design, exibe peças do acervo da Rosa Kochen – inclusive com uma dupla de ampulhetas explicitando o tema deste post. E as cerâmicas de aparência rústica contrastam com o aspecto industrial do cenário de forma muito dinâmica e atual. As estantes de minha casa também ostentam uma grande mistura de elementos das mais diferentes origens, épocas e estilos, uma manifestação explícita de meu apreço pela diversidade cultural, social e estética. E são um pouco (ou muito...) mais cheias do que as estantes da foto acima, para desespero de minha secretária do lar, que entra em pânico cada vez que tem que limpá-las.

Projeto de Arqdesign Brassaroto e execução da Tinoc, a estante acima é pura poesia ao atrelar a forma de uma árvore ao conceito de adquirir conhecimento, através dos livros e revistas que ostenta. Parece que a estante vai continuar crescendo com o tempo, com novos livros sendo adquiridos ao longo da história das crianças que habitam este quarto, um desenho lúdico que parece despertar a curiosidade e o interesse dos pequenos em consumir conhecimento e histórias ao longo de seu crescimento.

O sofá Búzios, do portfólio de produtos da Velha Bahia, é outro produto que inspira o dolce far niente, indispensável para uma passagem do tempo tranquila, saudável. Inegavelmente confortável, dá vontade de se jogar nele e ficar horas pensando no futuro, no passado, lendo, ouvindo histórias com amigos – e nesse tom que remete à uma arquitetura vernacular ele ainda ganha outra dimensão.

O nome do puff acima é Mandacaru, design de minha amiga Roberta Banqueri, no acervo da Way Design. Mas eu vejo neste banco um resgate de técnicas ancestrais, uma reinterpretação do design dos povos originários, em perfeita sintonia com o tapete da Avanti Tapetes que já citei aqui, cujo desenho parece ter sido amalgamado, sedimentado ao longo de anos, décadas, séculos. O bom design tem esta característica, não apenas se mescla a outros produtos, a vários estilos, como também carrega uma história em sua origem, em sua criação.

E termino este post com a foto acima, da Velha Bahia, que me remeteu imediatamente à minha infância, aos almoços na casa de minha avó materna, quando um banco era colocado de um lado da mesa para caber todos os netos -e onde, diz a lenda, tomei meu primeiro porre (de Carpano!) aos cinco anos, exaltando minha precocidade aos prazeres do palato. Eu tive uma lembrança quase vívida destes tempos ao ver este espaço, que na casa de minha avó ficava na cozinha, em meio ao cheiro de comida sendo feita, o som que tocava num toca-discos e a fala alta da família oriunda de italianos, com as crianças ajudando a pôr a mesa, e foi uma sensação muito boa ver que nossa memória pode ser despertada através deste tipo de produto.

 

Albert Einstein certa vez definiu o tempo sob uma estranha perspectiva – ele apregoava que “...o tempo é uma ilusão. A única razão para o tempo existir é para que tudo não aconteça de uma vez.”  Já Sêneca, o grande filósofo, afirmava “...apressa-te a viver bem e pensa que cada dia é, por si só, uma vida.” Entre o físico e o filósofo, meu coração- e pensamento - escolhem o filósofo.

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