Background Image
Table of Contents Table of Contents
Previous Page  100 / 164 Next Page
Information
Show Menu
Previous Page 100 / 164 Next Page
Page Background

– Moço, é farofa de abóbora?

– Não. É farofa de jerimum.

– Achei que fosse de abóbora.

– O que o senhor chama de abóbora,

nós aqui chamamos de jerimum.

– Ah, então é a mesma coisa...

– Não. É jerimum.

– Uhn...ok. Eu vi passando uma

carne seca com aipim, eu queria

aquilo.

– Não temos isso no cardápio não.

– Mas eu vi passando! Olha ali

aquele garçom carregando, junto

com a farofa de abóbora!

– Aquilo ali é carne de sol com

macaxeira, arroz de coco e farofa

de jerimum.

– Ah...então macaxeira é aipim?

– Se o senhor está dizendo, então

é...

– E carne seca aqui chamam de

carne de sol?

– Não. Carne seca é uma coisa,

carne de sol é outra.

– E qual a diferença?

– Moço, o senhor conhece

Google? Dá uma procurada, eu

não posso explicar agora, porque

tenho que servir as outras mesas,

fora a sua...

– Tá...entendi a indireta. Traz então

a carne de sol como aquela que

passou ali.

– Sim, senhor.

– Querido, você ainda vai arranjar

encrenca aqui com essa sua mania

de ficar discutindo com garçom.

– Que discussão, Valentina? Parece

que estou em outro país! E não

tem nem tecla SAP nos cardápios

ou nos garçons! Sou obrigado a

saber que aqui aipim é macaxeira e

que abóbora é jerimum?

– Ainda estamos na hora do almoço,

e essa é a segunda encrenca

que você arruma por causa de

comida...

– Você está falando do café da

manhã? Aquilo era canjica, e a

moça me disse que não, que era

mungunzá. E o outro era curau, e

ela me disse que era canjica! Acho

que estão tirando um sarro da

minha cara, só pode ser isso.

– Meu amor, eu já te disse que

quando criança morei em Santos,

no litoral paulista, não disse?

Pois bem, lá chamam o pão

francês de “média”. Quando

fomos morar em São Paulo,

minha mãe me mandou comprar

três pãezinhos na padaria. Eu

cheguei lá e pedi “me dá três

médias, por favor.” O português,

dono da padaria, me disse – para

você? Eu respondi que sim, claro.

Ele me mandou para o outro

balcão, e me serviram três copos

de café com leite. Para eles,

média era isso, para mim era o

pão francês. Mas rapidamente

me acostumei e nunca mais tive

este tipo de problema. A gente

mora num país continental, com

várias influências e sutilezas

regionais e, consequentemente,

várias diferenças – e você sabe

disso. Quando fomos para aquele

roteiro dos vinhos no Sul, você

quase se atracou com o gaúcho

WA I R DE PAUL A J R .

Um diálogo do cardápio brasileiro

MAGAZINE CASASHOPPING

100

• •

crônica gulosa