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Coral (ainda) Vivo

Wair de Paula, Jr.

Como tem feito nos últimos anos, o Pantone Color Institute lançou a “cor 2019” – e, neste ano, a cor escolhida chama-se Living Coral. Esta escolha teoricamente chega através de um processo que estuda e analisa tendências, influências, para chegar através desta pesquisa numa cor que, seguramente, veremos muito nas próximas exposições de decoração e design de interiores ao longo do ano – como ocorre sempre após o lançamento de uma cor pelo Instituto Pantone.

A escolha desta cor traz, em si, um paradoxo – infelizmente, os corais estão embranquecendo (ou perdendo totalmente a cor), resultado da junção do aumento da temperatura da água do mar com a crescente poluição. Corais são, na realidade, animais – e um tipo peculiar que segrega um exoesqueleto calcário (ou de matéria orgânica). Podem constituir colônias e formar recifes de grandes dimensões que abrigam um ecossistema com grande biodiversidade. Colaboram para esta eminente – e perigosa – possibilidade de desaparecimento total da espécie  a pesca excessiva, a introdução de espécies invasoras e a ocupação desordenada das costas, aumentando a poluição. Por enquanto o Brasil sofre apenas com o branqueamento , ainda não está perdendo suas “coberturas coralíneas”. Porém, em virtude da pesca exploratória com índices acima do permitido, o número de peixes herbívoros que vivem nos recifes diminuiu consideravelmente. Algumas espécies de peixes e alguns tipos de ouriços mantêm a relação entre algas e recifes equilibrada. Se os peixes desaparecem do local, as algas comuns tendem a se proliferar.



Se a escolha desta cor conseguisse trazer à tona esta discussão, seria ótimo. A ação predatória do ser humano sobre os recursos naturais do planeta (que não são inesgotáveis) está, cada dia mais, sendo discutida por cientistas, e as grandes empresas tomam esse assunto para si também (e as vezes principalmente) por estratégia de marketing.



Segundo o site da empresa Pantone (pantone.com.br), o “...Living Coral nos acolhe com sua aura cálida e nutritiva, flutuando e reconfortando num ambiente em constante transformação...”, e mais uma série de argumentos justificando – através de experiências e outros termos como “imersivo”, “conectividade”, “intimidade” o que, na verdade, é uma estratégia de marketing. Segundo a empresa, a “...natureza envolvente desta cor nos encoraja a ter atitudes espontâneas...”. E, neste momento, lembro-me de uma preciosa frase creditada à grande dama do décor francês, Andrée Putman, que, confrontando uma crítica à sua palheta de cores, sempre neutra e sóbria,  teria dito que “...o fato de eu pintar uma parede de laranja, em minha casa, não vai fazer com que eu fique alegre...”.



Este conceito de “a cor do ano” é uma estratégia inteligente, divertida, uma moda como várias. Induz ao consumo, e isto de certo modo é bom, pois faz girar os mecanismos do comércio, da indústria, dos impostos, possibilitando o crescimento da economia, com a conseqüente melhora dos índices de desenvolvimento humano (considerando-se que o dinheiro seja aplicado da forma ética, mas isto é um outro – e longo assunto).



Claro que estou cético (como Mme. Putman) sobre o efeito de algumas cores sobre nossos humores. A casa é um pouco mais do que um ajuntamento de coisas e conceitos estéticos : é onde passamos boa parte de nossa estadia neste planeta, onde descansamos, amamos, sofremos, nascemos e envelhecemos. O que faz uma casa gostosa é a soma de inúmeros valores lógicos e racionais (como a escolha certa do designer de interiores, por exemplo) mais a personalidade do morador. E aqui me lembro de uma história do grande profissional carioca, Luiz Fernando Redó, que teria feito a casa de importante senhora da sociedade toda em vermelho. Eu conheci a casa, era linda, e absolutamente adequada à personalidade da dona. Mas era vermelho em quase tudo, e um convidado (mal educado, claro) ao ver toda aquela feérie teria dito “...nossa, mas isto aqui está parecendo o inferno!”, no que a anfitriã, que ouviu esta frase infeliz, respondeu “...sim, é o inferno, e eu sou o diabo em pessoa!”



E rezar para que, no futuro, quando a empresa lançar outro tipo de tom coral, não seja o branco (acima, um coral antes e depois do processo de branqueamento), prova inequívoca da falta de cuidados que temos para com nosso planeta.

Wair de Paula, Jr.

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